Autor: Darci Garçon
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Tem gente que nasce “virado para a lua”. Este caso real explica bem o que quero dizer.
Andrew vibrou quando foi transferido para o Rio de Janeiro por sua empresa. Depois de um ano e meio, foi solicitado a retornar a São Paulo. Como ele e sua família estavam se dando bem na cidade maravilhosa, optaram por permanecer lá mesmo, ainda que tivesse que buscar outro emprego. Encaminhou seu currículo para um headhunter e, dias depois, estava empregado, num cargo melhor, em uma multinacional inglesa. Dois anos depois, essa mesma empresa, propôs que ele se transferisse para a matriz, na Inglaterra, seu país de origem e onde mora parte de sua família. Andrew e família estão felizes em Londres, de onde ele sai, com freqüência, para correr meias maratonas e conhecer outros países, da Europa.
É claro que isto não acontece com todo mundo. Antes de mais nada, ele estava no lugar certo, na hora certa. E foi ajudado por uma série de eventos ou coincidências favoráveis mas, de qualquer forma, se não estivesse suficientemente pronto e estruturado, no que diz respeito às suas competências para o exercício do novo cargo, obviamente, nada disso teria acontecido.
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Falar em “talentos” é o modismo do momento. Dizem que as empresas estão preocupadas em “reter talentos”, isto é, estão procurando evitar que os seus melhores colaboradores deixem a empresa bandeando-se e enriquecendo o quadro de funcionários dos seus concorrentes.
Mas, afinal, quem é “talento” nas empresas? Segundo um experto no assunto, professor Francisco Ramirez*, “talentos são aqueles 20% de funcionários mais críticos para o negócio; os que têm impacto sobre 80% sobre os negócios”. “Certamente, são cargos que dão visibilidade e oferecem chances efetivas do funcionário mostrar serviço”, complementa. E, por isso, tornando-se merecedores de melhor remuneração, cogitados para transferência ou promoção, com direito a receberem outros privilégios.
Ainda segundo Ramirez, “é pouco provável que alguém consiga ser visto como um “talento” ocupando função rotineira e pouco relevante para os resultados da empresa”. Estes são os que estão fadados a permanecer no mesmo cargo por muito tempo, sem melhorar a remuneração, estão sujeitos a transferência para cargos semelhantes, no mesmo nível sem direito a privilégios.
Poderia haver outra definição simples e mais acadêmica para talento: ter talento é ter habilidade natural para o exercício de uma profissão. Além disso, está inerente a esse conceito, o fato de a pessoa gostar do que faz e, por isso, encontrar forte motivação para o cumprimento de suas responsabilidades e apresentar desempenho diferenciado.
No entanto, para o que queremos neste artigo, fica valendo a definição do ilustre professor, que é um conceito assumido no meio empresarial, válido e vigente.
Os 20% dos funcionários que ele menciona, certamente, trabalham em atividades que têm impacto sobre resultados financeiros. Por exemplo, atuam em desenvolvimento de produtos, em vendas, compras, sabem como reduzir custos e despesas, diminuir desperdícios, aumentar a produtividade, melhorar a qualidade, fazem boas e rentáveis aplicações financeiras, e assim por diante.
Mas, há um senão: o principio fundamental é que apenas ter sorte não é suficiente. Por exemplo: você acha que o Paul Tergat – um dos melhores corredores de todos os tempos, recordista mundial de maratona e meia maratona – é o que é, apenas por ter sorte? Lógico que não. Ele tinha e tem talento e juntou, talento com disciplina para treinar, e vida regrada para chegar onde chegou. Além do mais, escolheu o esporte certo. Será que ele teria sucesso como jogador de vôlei ou de futebol? E mais: para ele, correr não é apenas uma forma de ganhar dinheiro. Ele gosta do que faz e já disse que, por ele, jamais penduraria os tênis…
Dessa forma, somos levados a pensar que um componente importante da sorte está em procurar, desde o início da carreira, uma profissão que o leve a classificar-se entre os 20%. E se você já ultrapassou essa etapa e, presentemente, se encontra numa função rotineira e pouco relevante? É procurar sair dela. Isso é possível? Sim, dependendo da iniciativa e do esforço que você estiver disposto a fazer.
Pensemos que você não está acomodado e está infeliz com o que está fazendo. Concluiu que chegou a hora de partir para outra atividade, mais compensadora, tanto do ponto de vista da realização pessoal, quanto das suas expectativas financeiras. Pressupondo que sua preferência será a de continuar a trabalhar com registro em carteira, os passos serão os seguintes:
- descubra as profissões que lhe darão condições de estar entre os 20%;
- considere algumas possibilidades, bem próximas do que você gosta de fazer, e fará bem feito;
- decida o que irá fazer. Não deveria ser algo absolutamente diferente do que está fazendo presentemente. Dependendo das circunstâncias, uma mudança radical poderá inviabilizar a mudança;
- faça uma lista de conhecimentos e aptidões que precisará aperfeiçoar, obtendo a ajuda de algum amigo ou assessoria da área de RH da sua empresa;
- aproveite seu tempo disponível para ler artigos ou livros ou faça cursos sobre o assunto, mesmo que você tenha de pagar por isso;
- observe como seus colegas bem sucedidos se comportam e tente descobrir os seus segredos;
- no trabalho, mostre curiosidade pelo que esses colegas fazem e demonstre interesse em participar de novas experiências;
- havendo dificuldades de mudar, em sua empresa atual, passe a cogitar a possibilidade de ir para o mercado de trabalho.
Vamos considerar outro exemplo: quantas pessoas você conhece que nunca praticaram nenhum esporte e que, com paciência, obstinação e disciplina, tornaram-se corredores? Certamente, muitas, e você mesmo pode ser uma delas. Deram uma virada na vida sedentária, em função de uma necessidade ou por simples prazer. No trabalho, pode acontecer da mesma forma. Mas, é preciso planejar, estabelecendo objetivos e não esperar que as benesses caiam do céu.
Os corredores de elite, como Tergat, que vencem as provas, acumulam duas qualidades essenciais: uma delas é o talento, isto é, a aptidão natural; a outra é a disciplina para treinar, entra dia sai dia, com sol ou com chuva. Portanto, acumulam talento e disciplina, por isso, se destacam e atingem mais rapidamente à meta de chegada..
Voltando ao caso do Andrew, você poderá não conseguir mudar-se para Londres, mas se fizer algum esforço poderá redirecionar a sua vida e a sua carreira profissional podendo, com isso, conseguir as vantagens que você busca.
* Revista Melhor: Ensaio: Manter os melhores por perto Francisco Ramirez, professor do IBEMEC e headhunter.
** Formado em Pedagogia pela USP, Darci Garçon é head hunter, sócio-diretor da TAG Consultores trabalha há 40 anos em Recursos Humanos.